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World Trade Center, 11 de setembro de 2001
Caro Doug,
As circunstâncias desta vida fizeram-me chegar ao
nível de enviar-te esta carta. Poderia arrumar argumentos e artifícios para
dizer não, mas o mesmo seria para mim e não somente para você. Imagino que não
esperava recebê-la. Sei de algumas coisas, por mais que eu pareça um louco
vagando pelo mundo numa realidade em que abominas. Pouco importa pra mim!
Precisava desabafar e descarregar o peso que você
colocou em minhas costas há 28 anos, quando eu tinha apenas 5 anos de
idade. Eu não devia dizer nada, admito. Mas a força que existe em meu ser faz
com que me torne, muitas vezes, tolo. Explicá-lo-ei.
Fui chamado para trabalhar no socorro de milhares de
vidas, quando surgiu o "ataque dos terroristas" nas Torres Gêmeas,
logo pela manhã. Resgatei 1035 pessoas e encontrei mais de 300 corpos
soterrados. O trabalho foi pesado e quando estava no segundo andar, dos poucos
que restaram, uma grande rocha levou-me ao chão. Desmaiei e acordei com os
destroços prendendo meu braço esquerdo, deixando-o em atrito com o chão. O
sangue ainda jorra perante o meu corpo e lembro-me de você. Lembro que o sangue
que percorre entre os restos desta torre é o mesmo que desliza em tuas veias, por mais que eu não quisesse.
Está frio aqui, mas não mais do que aqui dentro do meu
coração, pela tamanha discrepância que fizeste comigo. A dor, em meus ossos,
está incômoda, mas não mais do que a dor que as suas atitudes afetaram a minha
vida.
Eu te odiei, pai. Odiei teus olhos crus ao contemplar
os da mamãe, chorando ao vê-lo abandoná-la por causa do seu envolvimento com a
secretária cachorra – que por diversas vezes tentou seduzir-me. Tome aí! Mas
recusei-a com todas as minhas forças. – Odiei o jeito que você falava com ela,
ao chegar em casa, e vê-la preparando o seu alimento que, às vezes, não era do
seu total agrado. Odiei suas mãos diversas vezes quando pegava os instrumentos
mais pesados e mais doloridos para me acertar. Você batia tão violentamente que
as minhas nádegas não ficavam somente roxas, mas algumas partes ficavam na
carne viva. As lágrimas rolavam não somente pela dor, mas pela raiva, pelo ódio
de como tratava seu único filho. Suas palavras doíam mais do que as surras, os
socos e os gritos.
Eu tive dó de mim por sofrer tanto em suas
"mãos", por sentir o vazio que existe aqui porque deixei espaço para
que o seu calor o preenchesse, mas, hoje, percebo que a dó maior é por você.
Pois estás isolado, vive sozinho sem a pessoa que tanto amava, sem a cachorra
que tanto queria e sem o filho que sempre odiou.
Não o amo somente por isso, é supérfluo, mediante as
coisas que fizeste. Tantas e tantas noites chorei, lamentando e procurando um
abraço seu, um carinho e um beijo fraterno, mas você só sabia pisar e torcer
minha cabeça como se eu fosse o verme da sua vida. E, pra você, eu sei que sou.
Eu enfrentaria dias sem comer, sem beber e ainda sem
algum membro, mas enfrentar as mágoas que você nos causou é como morrer todos
os dias, não em pequenas quantidades, mas em doses suficientemente marcantes
para surgir um câncer no coração, causando um oco dentro dele e destruindo as
partículas eminentes.
Eu poderia muito bem, nestes pequenos instantes de
vida, estar preocupado em escrever uma carta para minha querida mãe ou para
minha esposa, mas os desvios da realidade batem à porta e mostram-me que, o amor
que sinto por elas, elas têm consciência. Talvez bem menos, comparado à imensidão dos meus sentimentos. Mas você, pai, eu repudiei, desprezei e
desgostei de todas as ações.
Apesar de tudo isso ter acontecido, sinto sua falta.
Quero pedir perdão por todas as coisas ruins que pensei a seu respeito. Quero
morrer com a certeza de que o meu coração está limpo. Sei que é inútil, pois
não saberei a resposta. Mas perdoe-me por não ter podido partilhar das coisas
contigo, como um filho que tanto sonhou. Eu só tive medo, medo da sua rejeição.
Mande um abraço apertado para mamãe e um ardente para
minha grande mulher.
Tenho uma novidade: Você será vovô. Cuide da minha
princesinha. Faça, por mim, o que você não conseguiu fazer comigo.
Eu queria muito te amar, mas agora, talvez, eu não
tenha mais essa oportunidade.
Que Deus perdoe-me por não conseguir amar quem eu
mais queria nessa vida.
Não consigo mais continuar, falta-me o ar e as lágrimas atrapalham-me a visão.
Não consigo mais continuar, falta-me o ar e as lágrimas atrapalham-me a visão.
Daquele filho que sempre desejou os teus braços,
mas só encontrou farpas ao tentar sentir a tua pele.
Com desejo de sobrevivência interna,
Park
Que carta de partir o coração, será que ela chegou ao destino?
ResponderExcluirNaty!
ResponderExcluirNossa! Que carta triste e emocionante...
Confesso que as lágrimas caíram dos olhos.
Só quem esteve presente naquele momento, ou perdeu alguém naquele ataque, sabe a dor que sente...
“Sonhar é acordar-se para dentro.” (Mario Quintana)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
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Nossa Naty que carta emocionante, e essa frase no final fiquei com os olhos cheios de lagrimas.
ResponderExcluirEssa carta foi de aperta o coração, senti uma carga afetiva muito grande em cada palavra escrita. Esse dia realmente foi muito angustiante, tanto para quem presenciou, tanto para todos nos que presenciamos a distância. Espero que ele tenha conseguido chegar onde queria.
ResponderExcluirChorei com estar carta, meus tios devem estar pensando que sou louca.. maravilhosa.
ResponderExcluirAté hoje essa tragédia mexe comigo.
ResponderExcluirAqui chorando no meio do ônibus