Ingenuidade ou
omissão?
Quando se tem John Boyne em mãos, não é necessário ler
sinopse, procurar resenhas, investigar avaliações. A gente fecha os olhos e
embarca. Mas nem sempre a gente deve fazer isso, colocar a mão no fogo às vezes
é um pouco arriscado. Porém, quando se trata da qualidade do autor, eu ainda
vou vendada e despreocupada.
Sua mãe tornou-se beata de uma igreja, beirando o
fanatismo. Assim, pode-se compreender a influência dela para que o filho se
tornasse padre. A história de Odran é marcada por fatos trágicos que podem
mudar uma vida, inclusive a de pessoas ao seu redor.
Odran conhece Tom Cardle dentro do seminário e este se
sente infeliz, já que foi obrigado a ser padre por conta do pai. Dividindo um
quarto, eles se tornam amigos, mas a inocência de Odran não o deixa enxergar o
quanto Tom é diferente, uma pessoa perturbada. Mas será que ele percebe que
existe algo a mais?
É difícil engolir a história, não se emocionar e não
querer arrancar alguns personagens e matá-los, torturá-los com todas as nossas
forças. Abuso sexual não é um assunto fácil de lidar. Ainda que John Boyne
tenha sabido fazer, tenha colocado a sensibilidade e a dor, a omissão excessiva
me incomodou muito.
Perder um amigo ou
ganhar um inimigo?
Não é que o autor tenha errado ao percorrer esse
caminho, mas não me senti confortável por ter passeado por ele. No entanto,
entendo os seus motivos, já que ele fez isso para dar mais realidade à obra. E
conseguiu. Só que me prendi num grande detalhe (ainda que imperceptível): eu
estava torcendo por uma pessoa criminosa, defendendo uma pessoa má,
simplesmente por achar que era o oposto.
É assim que o autor nos mostra, é assim que a vida nos
alerta. Quantos de nós somos arrastados para um mundo repleto de desculpas, de
mentiras? Somos enganados durante tanto tempo, simplesmente porque confiamos em
alguém, entregamos nossa vida nas mãos de quem sequer valoriza. É isso que
Boyne nos passa, ainda que o contexto seja dolorido e nos faça chorar
incessantemente.
As três estrelas não são por má qualidade do autor,
por ele ter deslizado na narrativa, por ter pecado no tema. Não é nada disso.
Um dos personagens parece cativante e, ainda que eu estivesse com dúvidas,
resolvi acreditar que era ilusão da minha cabeça. Mas não era. Estava certa o
tempo todo e não quis enxergar como uma pessoa pode manipular a mente da outra,
como pode enganar de forma tão descabida e mentir na cara dura. Isso fez com
que eu desgostasse um pouco do livro.
Além disso, nesse livro seria fundamental que os
diálogos fossem com travessão. O uso das aspas me incomodou mais do que o
normal. Isso deixou a leitura um pouco arrastada e, algumas vezes, o pensamento do narrador ou algum termo era colocado entre aspas, o que dificultava saber o que
era uma fala ou um pensamento. Por esse motivo, precisei largar um pouco a
leitura para respirar novos ares, sem contar que a história é carregada de
sentimentos e é impossível não sentirmos uma sensação ruim, um tanto desconfortável.
Repulsa.
A capa é linda e a contracapa também. A diagramação é
simples, porém confortável. Para quem gosta de histórias com assuntos
polêmicos, certamente vai gostar desse. No entanto, prepare-se! Não será nada
fácil.
Quotes:
“‘Ela tocou em você? Tocou em você lá embaixo?’ Ele
usou a cabeça para indicar a região abaixo da minha cintura. ‘Conte-me o que
ela fez, Odran. Ela tocou em você? E você, tocou em si mesmo? Mostrou a ela o
que tem aí? Você é um garoto imundo, Odran, é isso? Eu acho que é. Acho que
você faz um monte de coisas neste quarto, não faz, Odran? Tarde da noite.
Quando acha que ninguém está ouvindo. Você é um menino imundo, Odran, é isso?
Pode me dizer. Vamos, diga.’” (p. 124)
“Lembre-se, meu jovem amigo, a vida é fácil de narrar,
mas atordoante de se praticar.” (p. 233-234)
“Ali estava ele. Ao meu lado, seu hálito pútrido no
meu ouvido, seu braço ao redor do meu ombro, me puxando na sua direção, suas
mãos arrancando minhas calças, buscando o que havia por baixo. Apertei minhas
mãos contra as orelhas. Ele estava ali. Ele estava ao meu redor.” (p. 321)
“‘Não, o culpado é ele’, disse Aidan. ‘Mas, sim, você
o trouxe para a nossa casa. Você o deixou sozinho comigo. Entendo que você se
sinta culpado e que você não pode ser responsabilizado pelas ações de outro
homem, mas essa foi uma longa estrada para mim, uma estrada de vinte anos. Os
danos que aquele homem causou em mim numa única noite são danos que eu levarei
para o túmulo. Portanto, não é fácil esquecer sua participação nisso.’” (p.
382-383)
Título: Uma história de solidão
Autor: John Boyne
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 416
Ano: 2016
Olá, Natalia.
ResponderExcluirEu tenho esse negócio das falas com aspas igual a você, me incomoda demais. Mas é um livro que eu leria. Só li um livro do autora até agora e foi o que bastou para eu querer ler todos dele. E fiquei curiosa para saber mais sobre essa pessoa tão dissimulada.
Prefácio
Ai, Sil. Nem me fale nisso de aspas.
ExcluirEu fico irritada, mas nesse livro foi mais porque eu ficava confusa às vezes rsrs.
Oi Natalia, tudo bem?
ResponderExcluirEu li apenas um livro do John que é O Menino do Pijama Listrado e gostei muuuito. Nunca tinha ouvido falar sobre este livro, e nem sei o que pensar. Não gosto de ler/ver coisas relacionadas a abuso sexual, então acho que este não é um livro que eu leria.
Beijos
Oi, Lara.
ExcluirEu não cheguei a ler esse, li apenas outros do autor e amei.
O assunto é meio pesado, mas vale a pena ler.
Beijos
Até o presente momento nunca li nada desse autor, e apesar de conhecer esse livro, não imaginava que a história falava sobre abuso sexual. Por se tratar de um assunto complicado sempre que lemos sobre isso e difícil lidar, até porque nos colocamos no lugar da pessoa. Imagino que o ponto negativo da leitura seja a narrativa tenha sido usa por aspas, e não por travessão. Na maioria das vezes não tenho problema com isso, porém não consegui distinguir pensamento com fala deve ter sido um tanto quanto incomoda.
ResponderExcluirÉ bom ler, Lana.
ExcluirJohn Boyne é um dos meus autores preferidos.
Uma pena que esse não tenha sido como eu imaginei, mas é bom, no geral.
Não conhecia esse livro dele. Mas quando se trata do autor é mesmo pra ir e se jogar e ler a sinopse só depois.
ResponderExcluirAo menos vejo muita gente que adora os livros dele. Ainda não consegui ler nenhum, infelizmente =/
Mas nossa, esse parece ser bem tenso heim? O tema é forte e pelo jeito é difícil de ler, muito real, talvez, e cheio de sentimentos, parece que desperta uma confusão e descrença. Acho interessante quando um autor consegue deixar a gente até desconfortável com a história. Então acho que iria gostar bastante dessa. Parece um bom livro pra mim.
Verdade, Cris. É pra se jogar de olhos fechados hahaha.
ExcluirVou sem medo.
É um bom livro sim, mas não é o melhor do autor
Oi, Natalia!
ResponderExcluirNunca li nada do autor, e se eu fosse começar a ler, não seria por esse livro. Não gosto de nada relacionado a abuso sexual, e saber que o Odran foi obrigado a virar padre me irritaria muito durante o livro..
Beijos
Eu recomendaria que começasse por outro mesmo, Gaby, ainda que possa gostar desse.
ExcluirMas é sempre bom começar por um que consideram favorito rs.
Beijos
Oi, Naty
ResponderExcluirO autor é sempre tão elogiado. E se não me engano já vi elogios seus. Também sou dessas, de ler muitos livros somente pelo autor. Uma pena que teve algumas ressalvas durante a leitura, inclusive aspas ao invés de travessões também me incomoda.
Gostei de ver suas impressões.
Eu sempre elogio o Boyne, Lê hahaha.
ExcluirMas esse infelizmente não foi tanto quanto gostaria
Natália!
ResponderExcluirAbordar um tema tão forte quanto o abuso sexual de menores ainda mais em um lugar que deveria ensinar a palavra de Deus, deve mesmo tornar o livro repugnante e doloroso.
E bom saber que ele aborda a manipulação psicológica da personagem.
Gostaria de ler.
“Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.” (Guimarães Rosa)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
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Muito repugnante e doloroso, Rudy.
ExcluirMas infelizmente essas coisas acontecem
Odeio quando usam aspas no lugar do travessão dependendo da diagramação fico perdida até pegar o ritmo da leitura.
ResponderExcluirMais um livro com tema de abuso sexual e mais um que não teria condições de ler apesar de parecer muito bom.
Eu fico perdida também, exatamente assim hahaha
ExcluirUau, que rápido, Thalita!
ResponderExcluirEu não consegui ser tão rápida assim hahaha.
Esse final me deixou exatamente assim mesmo. Que raaaaaaaaiva.
Beijos
Pesado, não sei nem dizer se leria esse livro porquê além de ter um tema bem polêmica ainda vem com aspas, seria muito problema colocar um travessão ? Eu imagino que você lendo deve ter sentido um desconforto terrível afinal quem não sentiria só uns trechos e.eu já fiquei agoniada. Eu só digo que dispenso essa leitura.
ResponderExcluirO tema abordado é forte, tem que estar preparado para ler e também revoltante, ainda mais em um lugar como este. Tem pessoas assim na vida real que são capazes de manipular a mente de alguém, eles tem uma lábia que as pessoas caem em suas conversas, infelizmente tem pessoas capazes de muitas coisas que ficamos horrorizados. Ainda não le nenhum livro do autor, mas quero ler, são bem elogiados.
ResponderExcluirOlá, o livro se trata de um assunto atual e muito importante e conta com uma história comovente, fazendo que fiquemos muito apegados a alguns personagens. Beijos.
ResponderExcluirTambém não gosto de diagramações sem travessão, isso realmente atrapalha. Gostei da história e fiquei bem intrigada para descobrir o que tem nessa história, a pura verdade, quem é o culpado, e porque é culpado. Abuso sexual é um tema muito forte e triste, mas é bom ver isso na ficção, para que as pessoas saibam que ele existe em todos os lugares, mesmo que você pense lá não há maldade, talvez ali seja o pior lugar. Sua resenha está ótima, e esta é também uma boa dica. A capa é realmente bonita. Nunca li nada do autor, só assisti ao filme O menino do pijama listrado, então é claro que quero conferir alguma obra do autor.
ResponderExcluirAbraço!
A Arte de Escrever
Oi, Natália!
ResponderExcluirNunca li nenhum livro de John Boyne. E esse livro me surpreendeu muito com o tema abordado. Nunca li nenhum livro que utilizava as aspas no lugar do travessão, mas acho que é bem incomodo fazer uma leitura assim.
Beijoss
Nat, temas assim sempre são difíceis de poder ler, eu particularmente não aguentaria ler o livro sem sentir repulsa do início ao fim, na verdade, conseguiria nem abrir ele, por mais bonita e encantadora que a capa seja. E eu já li alguns livros que usam aspas, e eu odeio isso, me deixa muito irritada, para mim só se deve usar quando é alguma citação. E foi uma ótima resenha, como sempre, mas não seria fácil para mim ler essa obra.
ResponderExcluirOi Nati...
ResponderExcluirAté hoje não li nada de John Boyne, apesar de já ter visto muitos comentários positivos sobre ele... Acredito que muito do que somos quando adultos é reflexo do que vivemos no passado, assim como Odran... Quero fazer essa leitura em algum momento, mas isso não acontecerá tão já...
Beijinhos...
Oi.
ResponderExcluirEu ainda não conheço o autor, mas já admiro seu trabalho, e apesar de gostar de evitar livros que temáticas polêmicas ou que mechem com assuntos delicados esse eu não poderia deixar de ler, a premissa é um tanto que triste principalmente no quesito do abuso sexual e te entendo, é quase impossível se sentir confortável com uma leitura assim, mas irei dar uma chance sem sombre de dúvidas.
Bjs.