O dilema da humanidade em colapso

"Ah, mas então esse é o livro que deu origem ao tal filme Blade Runner... Ok.: Já que muita gente descobriu Philip Kindread Dick por causa de Ridley Scott, por que não ler o romance a partir do filme? A obra audiovisual, de narrativa mais enxuta, serve como excelente trampolim para um mergulho hermenêutico no romance nec plus ultra de PKD. A começar pelo título." - Ronaldo Bressane

Em uma San Francisco pós-nuclear, parcialmente deserta após a Guerra Mundial Terminus, a humanidade fugiu para as colônia espaciais, especialmente em Marte. Quem não conseguiu escapar permaneceu no planeta Terra, deserto e corroído pela poeira radioativa. Rick Deckard é um caçador de recompensas com a missão de perseguir e desligar Androides de uma versão avançada chamada Nexus 6, a qual possui tecnologia avançada a ponto de fazer com que esses indivíduos se assemelhem, quase que perfeitamente, à raça humana, o que seria possível se não fosse por sua incapacidade de sentir empatia por outros seres vivos. Androides que foram criados de forma avançada a ponto de possuírem uma auto-reflexividade, o que os leva a repudiar seu status de escravos.


Rick possui o sonho de ter um animal de verdade, como seus vizinhos, e promete à sua esposa que irá aposentar os Androides foragidos ilegalmente na Terra, para conseguir dinheiro suficiente para substituir sua ovelha elétrica por um bicho da qual eles possam realmente cuidar.

Neste universo, o avanço tecnológico e a Guerra foram capazes de levar o homem a outro planeta, mas, por consequência, condenou a vida na Terra a escassez de recursos, e deixou para trás os habitantes que foram afetados pela densa poeira radioativa e hoje são conhecidos como Especiais. 

Os animais foram quase extintos, portanto, fazendo assim com que os poucos que ainda vivem sejam elevados a nível de raridade e objeto de desejo, já que, para os humanos, ter um animal de estimação é essencialmente à sua prova de empatia, pois diz-se que um Androide jamais seria capaz de cuidar de um devido à sua incapacidade de ser empático e consequentemente manter o animal com vida. Devido à sua raridade, os animais também são comercializados em uma versão elétrica, para àqueles que não possuem recursos suficientes para adquirir um de verdade. 


Conforme acompanhamos a jornada de Rick Deckard, podemos acompanhar também seus questionamentos sobre a missão a qual se propôs a fazer, já que em determinado ponto tudo o que acredita é posto em questionamento. 

O próprio título original traz à tona esse questionamento: Androides sonham com ovelhas elétricas? coloca o leitor na posição de Deckard, que em determinado ponto questiona-se sobre o quanto os Androides sonham em ser como os humanos, e sucintamente coloca também em pauta o quanto os humanos tentam a todo momento provar-se como tal. O título ainda deixa o leitor com o seguinte questionamento: Seria Deckard também um Androide? 
"Na batalha do nada versus nada, o humano parece menos real, menos vivo do que o não humano"

O que nos leva a discussão central que aborda o que de fato é ser humano, uma vez que o teste que identifica um Androide se baseia na capacidade empática do mesmo, sendo que a narrativa nos apresenta humanos que perderam os sentimentos naturais e são controlados pela mídia e pela sociedade, enquanto Androides possuem uma vontade de viver mais clara que os próprios humanos, já que nem mesmo eles sabem sobre sua origem, uma vez que têm vidas simuladas através de lembranças implantadas.
"Você será requisitado a fazer coisas erradas, não importa para onde vá. É a condição básica da vida, ser violado a violar a própria identidade. Em algum momento toda criatura vivente deve fazer isso. É a sombra derradeira, o defeito da criação; é a maldição em curso, a maldição que alimenta toda a vida em todo lugar do universo."
A relação entre homem e máquina é estabelecida como criação que almeja ser real, e criador que se torna dependente de suas criações para se tornar realidade.

"Androides não podem conceber filhos. É uma perda? Não quero saber, realmente; não tenho como dizer. Qual a sensação de ter um filho? Nós não nascemos; não crescemos; em vez de morrer de velhice ou de doença, desgastamos com o uso, como formigas. Formigas de novo; é o que somos. Não você; eu. Máquinas quitinosas com reflexos que não estão vivas de verdade. Eu não estou viva! você não está indo para a cama com uma mulher. Não se decepcione, o.k.? Você já fez sexo com um androide antes?"
A obra de K. Dick abrange ainda o campo espiritual a partir da caixa de empatia, com a qual o indivíduo se conecta à entidade chamada Mercer e pratica o Mercerismo (religião criada pelo autor), e através do sintetizador de ânimo, um gadget em que é possível programar o humor que o guiará durante o dia todo. O que demonstra uma busca incessante de preencher o vazio espiritual através da integração com o outro e com o cosmos. E, através de algumas passagens, instiga uma discussão sobre o despertar da alma das coisas, a vida recriada a partir da morte dos objetos abandonados pela humanidade. 

O que é realmente estar vivo, afinal?


Blade Runner, ou Androides sonham com ovelhas elétricas?, é uma obra magistral de um autor à frente do seu tempo, capaz de abranger e promover complexas discussões e reflexões sobre os mais profundos anseios e perigos da humanidade, uma verdadeira apoteose da ficção científica.
"A realidade é aquilo que, quando você para de acreditar, não desaparece" - Phillip K. Dick
Sobre as edições:
A Edição Especial de 50 anos é essencial para fãs da obra e colecionadores de belas edições, pois possui capa dura com jacket e diversas ilustrações maravilhosas.

Já a nova edição, nomeada como Blade Runner, assim como em sua adaptação de 1982, é a edição perfeita para a leitura no dia a dia. Edição em brochura e um pouco menor que a anterior, em tamanho ideal para ler.

Vale lembrar que as duas edições possuem trabalhos gráficos maravilhosos e material extra exclusivo com entrevistas e textos sobre a obra de Philip K. Dick.

Outras fotos:







Título: Blade Runner (Androides sonham com ovelhas elétricas?) [exemplar cedido pela editora]
Autor: Philip K. Dick
Editora: Aleph
Páginas: 288
Ano: 2019 (Nova edição); 2017 (Edição especial); 1968 (Lançamento)

7 comentários:

  1. Uau!!!Que edição espetacular!!!Tive que passar pelo post duas vezes, só para ficar admirando a diagramação deste livro!
    Mesmo sem ter lido a obra original(apenas vi o filme), tenho lido sobre o autor há tempos,óbvio e com certeza, ainda quero muito poder conhecer suas letras!
    Essa briga constante de máquinas e humanos é algo antigo, nítido no filme, mas que não sabemos onde terminará né?
    Com certeza, quero muito ter as duas edições em mãos!!!
    Beijo

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    1. Olá!
      Fico muito feliz que tenha gostado, e que a resenha tenha te despertado ainda mais o interesse pela obra ♥

      Sim, essa é uma briga que irá durar muitos e muitos anos ainda, temos muito a aprender com nós mesmos e com nossas criações. E PKD foi um visionário em relação à essas visões.

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  2. Oi Douglas!
    As fotos estao muito fodas man. Parabens! Eu vi só a capa divulgada nas redes da editora mas confesso que a premissa em si não me chama atenção.

    Abraços
    David
    http://territoriogeeknerd.blogspot.com/

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    1. Olá, David!
      Muito obrigado!
      Essa é uma obra que irá agradar realmente quem gosta de se aprofundar em ficção científica e nas relações humanas, que são temas bem recorrentes nas publicações da editora Aleph. Talvez dando uma olhada no catálogo deles você se interesse por algum outro título :)

      Até mais!

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  3. A edição especial é realmente maravilhosa e a nova edição não fica para trás. Eu, que assisti aos filmes, e até que gostei, sei que deveria ler o livro. Mas ainda não consegui. Fico bem com o pé atrás com ficção científica. Não sei se tem muitos termos nerds demais para eu entender. kkkk
    Mas, ainda pretendo fazer a leitura desse clássico.

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  4. Oi, Douglas
    Ainda não li nada de PKD, porém tenho muita vontade de conhecer sua escrita. Ele era a frente do seu tempo.
    Não assisti o filme, mas o enredo do livro é fascinante caçar androides para sobreviver, sonhar em ter um animal de verdade e ainda pensar naquele velho dilema ser humano X máquina.
    Quero muito ler, beijos!

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  5. Olá!
    Não tinha visto o filme e essa obra está uma maravilhosa. A historia é muito interessante com uma premissa muito boa. Eu fiquei bem curiosa por ela, ainda mas essa forma dele coloca a tecnologia na trama, gosto muito disso..

    Meu blog:
    Tempos Literários

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